O pioneiro João Ribeiro de Barros
O primeiro
aviador americano a voar entre a Europa e a América
17/02/2013
(Valdemar
Júnior)
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O comandante brasileiro João Ribeiro de Barros foi o primeiro americano
a voar entre a Europa e a América a bordo de um hidroavião italiano
Savoia Marchetti S-55, de prefixo I-BAUQ, apelidado por ele de "Jahú",
em 1927. Ribeiro de Barros contou com o apoio dos copilotos Arthur
Cunha, na primeira fase da travessia, e João Negrão, na segunda, do
navegador Newton Braga e do mecânico Vasco Cinquini.
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Divulgação |
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Comandante João
Ribeiro de Barros.
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Ribeiro de Barros nasceu em Jaú, no interior de São Paulo, no dia 4 de
abril de 1900. Entre 1917 e 1918, cursou Direito na Faculdade do Largo
de São Francisco, em São Paulo, mas, em 1919, mudou-se para os Estados
Unidos, onde dedicou-se ao curso de Engenharia Mecânica. Na França,
tirou o brevê número 88 da Liga Internacional dos Aviadores, em 21 de
fevereiro de 1923, e iniciou sua trajetória como piloto de avião. Em
seguida, voltou aos Estados Unidos para aperfeiçoar seus conhecimentos
como piloto e navegador e, posteriormente, foi para a Alemanha aprender
a fazer acrobacias aéreas.
Em 1926, deu início ao sonho de atravessar o Atlântico Sul a bordo de um
hidroavião. A ideia era decolar da Itália e voar para o Brasil sem o
auxílio de navios de apoio. No princípio, ele pediu apoio ao governo
brasileiro, mas não conseguiu. Nessa época, França, Inglaterra, Estados
Unidos e Alemanha eram os principais países que disputavam a supremacia
da aviação e, por isso, o governo brasileiro preferiu não se indispor
com as principais nações do mundo. Mesmo sabendo que muitos diziam que
seria impossível realizar seu sonho, pois nem França, Inglaterra,
Estados Unidos e Alemanha foram capazes de atravessar o Atlântico Sul
até 1926, Ribeiro de Barros vendeu parte de sua herança a seus seis
irmãos e viajou com o dinheiro para a Itália, onde estava sediada a
Savoia Marchetti.
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Rodrigo Zanette -
26/04/2012 |
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Savoia Marchetti
S-55 (Chamado "Jahú"), prefixo
I-BAUQ, único exemplar preservado no mundo, utilizado pelo
comandante João Ribeiro de Barros para atravessar o Oceano Atlântico
em 1927, exposto no
Museu TAM, em São Carlos.
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A empresa não vendeu
um modelo novo ao brasileiro e, com isso, Ribeiro de Barros e o mecânico
Vasco Cinquini viajaram para o Marrocos para comprar um S-55 usado, que
estava abandonado por lá, pois, em 1925, o conde Eugênio Casagrande
sofreu um acidente em Casablanca com o hidroavião quando tentava voar
entre a Itália e a Argentina. Antes de ser batizado de "Jahú", o
hidroavião era chamado de "Alcione", apelido dado por Casagrande. A
aeronave foi adquirida por 200 contos de réis. O avião foi reformado
pelo fabricante, que trocou os botes, e recebeu o nome "Jahú". Em
seguida, Ribeiro de Barros colocou as inscrições "vou ali" no bote
direito e "já volto" no esquerdo.
Ribeiro de Barros,
o copiloto Arthur
Cunha, o navegador Newton Braga e o mecânico Vasco Cinquini decolaram de
Sesto Calende no dia 13 de outubro de 1926 com destino a Gênova, na
Itália, e cinco dias depois decolaram de Gênova, mas os motores
apresentaram baixo rendimento e foram obrigados a amerrissar em Alicante,
na Espanha. Lá foram presos, pois o pouso não estava previsto na cidade.
Tratados, em princípio, como contrabandistas, foram soltos após a
intervenção do Consulado Brasileiro e no dia seguinte decolaram com
destino a Gibraltar. Lá, perceberam que havia algo errado na aeronave e
Ribeiro de Barros pediu para o Consulado Brasileiro investigar a
sabotagem. Uma comissão comprovou que havia água, sabão
e terra misturados ao combustível. A gasolina foi trocada e o avião voou
para Las Palmas no dia 25 de outubro de 1926, onde mais uma amerrissagem
de emergência foi feita após nova falha nos motores. De lá foram para
Porto Praia, em Cabo Verde. Ao levarem o "Jahú" para próximo da costa,
danificaram um dos botes e ao desmontarem os motores notaram a presença
de uma peça de bronze no fundo do cárter, caracterizando a segunda
tentativa de sabotagem.
Enquanto os reparos eram feitos em um dos botes, Ribeiro de Barros de
desentendeu com Arthur Cunha, que se desligou do grupo. Ainda em Porto
Praia, Ribeiro de Barros contraiu malária e voltou para o Brasil em um
navio para fazer o tratamento. Desiludido com as sabotagens, recebeu um
telegrama de sua mãe, Margarida Ribeiro de Barros, encorajando-o a
retomar a aventura e voltou para Cabo Verde.
Em março de 1927, o tenente da Força Pública de São Paulo, João Negrão,
desembarcou em Porto Praia e tornou-se o novo copiloto
do "Jahú". No dia 28 de abril daquele ano, às 4h30, decolaram de Cabo
Verde e amerrissaram em Fernando de Noronha às 17h, depois de percorrer
um trajeto de 2.400 quilômetros a uma velocidade média de 190 km/h sobre
o Atlântico Sul, com uma hélice avariada, que foi substituída por outra
e voaram com destino a Natal. De lá foram para Recife, onde foram
recebidos pela população, que comemorava o feito soltando rojões, o que
atrasou a amerrissagem do "Jahú", pois a tripulação temia que o avião
fosse atingido pelos artefatos. Carregados como heróis, foram levados
até o Parque Hotel, onde ficaram hospedados e foram homenageados com
festas, banquetes, bailes e recepções. Lá juntou-se ao grupo o mecânico
da Marinha do Brasil, suboficial Antônio Machado Mendonça. O "Jahú"
deixou Recife no dia 26 de junho de 1927 e pousou em Salvador. A
amerrissagem no Rio de Janeiro aconteceu em 5 de julho de 1927 e em
Santos no início de agosto de 1927. A missão acabou no mesmo mês, ao
amerrissarem na Represa de Santo Amaro, chamada hoje de Guarapiranga, em
São Paulo.
Para se ter
uma ideia do feito de Ribeiro de Barros, o norte-americano Charles
Augustus Lindbergh voou de Nova York a Paris 23 dias depois do "Jahú"
atravessar o Atlântico Sul e é considerado um dos grandes heróis dos
Estados Unidos.
Três anos
depois, Ribeiro de Barros queria fazer o trajeto inverso e, para isso,
adquiriu um hidroavião na Breguet, na França. A aeronave veio desmontada
para o Brasil e foi montada no campo de pouso Latecoere, em Praia
Grande. O modelo foi batizado de "Margarida", em homenagem à mãe de
Ribeiro de Barros, falecida em 1929, mas o avião foi confiscado pelo
governo, pois se iniciava a Revolução Constitucionalista. Ribeiro de
Barros se entristeceu tanto com a atitude, que deixou definitivamente a
aviação após o episódio e tornou-se um voluntário entre os
revolucionários. Ele viajou a pé pelo Vale do Paraíba, até à cidade de
Taubaté e doou aos revolucionários todo o ouro que possuía, incluindo as
medalhas recebidas pela travessia transatlântica de 1927. Durante o
governo do presidente Getúlio Vargas, Ribeiro de Barros foi preso em
Jaú, na fazenda Irissanga, de sua propriedade, pelo delegado Amaso Neto,
acusado de publicar clandestinamente um jornal de oposição ao governo de
Vargas, mas nada foi provado e ele foi posto em liberdade.
Solteiro e sem deixar filhos, Ribeiro de Barros faleceu em Jaú no dia 20
de julho de 1947, vítima de problemas hepáticos provocados pela malária,
contraída quando se preparava para atravessar o Oceano Atlântico. Seu
corpo foi sepultado no Cemitério Municipal de Jaú, mas alguns anos
depois seus restos mortais foram transferidos para um monumento
construído em 1953 para homenageá-lo, localizado na praça Siqueira
Campos, em Jaú.
O "Jahú"
Cerca de 200 bimotores hidroaviões Savoia Marchetti S-55 foram
fabricados na Itália, na década de 1920. A aeronave tem 16,5 metros de
comprimento, 24 metros de envergadura e 5 metros de altura. Foi
utilizado como bombardeiro, torpedeiro, em missões de reconhecimento
aéreo e de busca e salvamento. Era equipado com 2 motores Isotta
Fraschini Asso 750 de 880 cavalos, instalados em linha com hélices bipás
de 3 metros de diâmetro. Sua velocidade máxima era de 282 km/h, o
alcance era de 4.500 quilômetros e o teto máximo de 5.000 metros. O "Jahú"
está exposto no Museu TAM, em São Carlos.
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