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DC-3 "Rose" - De volta aos bons tempos

Voar a bordo do "novo" avião do museu da TAM foi uma oportunidade única
 
25/11/2007
(Valdemar Júnior) - Durante a cerimônia de inauguração do Museu Asas de Um Sonho, pertencente à Fundação EducTAM, no dia 11 de novembro de 2006, em São Carlos, o Comandante João Amaro, presidente da instituição, surpreendeu a todos os convidados ao afirmar, durante seu discurso, que a Boeing havia doado uma aeronave Douglas DC-3 em condições de vôo ao museu que estava sendo finalmente aberto naquele momento.

 

Rodrigo Zanette - 31/08/2007

  AVIAÇÃOPAULISTA.COM
 

Douglas DC-3 "Rose", N101KC, pouco antes de fazer uma passagem rasante no prédio do museu e das oficinas da TAM, no aeroporto de São Carlos.
Esta foto foi publicada na Revista Asas, edição número 39.

 

Não há como negar que um museu aeronáutico sem um DC-3 em seu acervo não é bem um museu aeronáutico. Isto porque esta aeronave é a mais famosa em todo o mundo, com quase 20 mil exemplares fabricados. Sem dúvida nenhuma, é o avião de transporte mais produzido na história da aviação.

Clique aqui e veja as fotos do DC-3 "Rose".


O DC-3

O DC-3 foi concebido para atender a um pedido da companhia norte-americana TWA (Transcontinental and Western Air), que precisava de uma aeronave para disputar o mercado interno dos Estados Unidos com a United Airlines, que tinha exclusividade na operação do Boeing 247.

No dia 2 de agosto de 1932, o vice-presidente da TWA, Jack Frye, enviou uma carta à vários fabricantes de aviões solicitando uma aeronave que pudesse transportar 12 passageiros e 4 tripulantes.

Donald Douglas recebeu a carta de Frye e, sabendo que além da TWA, outras companhias, como a American Airlines, precisavam de um avião com as características pedidas por Frye à Douglas, o fabricante norte-americano começou a trabalhar na unidade de Santa Mônica no projeto DC-1 (Douglas Commercial 1), que foi apresentado em 1933 e agradou a Frye.

Donald Douglas percebeu que precisava afinar o DC-1, que teve apenas o protótipo construído, e em seguida, mostrou ao mundo o DC-2, que tinha capacidade para 14 passageiros. O primeiro DC-2 foi entregue para a TWA em maio de 1934.

Ainda na década de 1930, quando o DC-2 era o modelo padrão nas rotas domésticas norte-americanas, a American Airlines pediu à Douglas um avião para operar em vôos costa a costa, sem escalas, com poltronas leito, e em resposta ao pedido, a Douglas apresentou um DC-2 esticado, chamado de DST (Douglas Sleeper Transport), com capacidade para 14 poltronas leito, e em seguida, a American Airlines encomendou 20 aviões.

Na fase de produção, a aeronave foi designada como DC-3, e voou pela primeira vez no dia 17 de dezembro de 1935. O DC-3 entrou em serviço no dia 26 de junho de 1936, nas cores da American Airlines, que dois meses depois, resolveu colocar poltronas comuns no lugar das leito, e com isso, conseguiu acomodar 21 passageiros.

Nos Estados Unidos, a Douglas fabricou 430 modelos civis DC-3, e durante a Segunda Guerra Mundial, a companhia de Santa Mônica desenvolveu uma versão militar da aeronave, conhecida como C-47, e produziu nada menos do que 10.225 aviões.

Fora dos Estados Unidos, foram fabricados 7.500 C-47 na ex-União Soviética, sob a designação Lisunov Li-2, e até no Japão, foram construídas mais 487 unidades, chamados de Showa L2D. Somando todos os modelos, foram fabricados 18.642 Douglas DC-3/C-47.


Operação no Brasil

No Brasil, o DC-3 foi o modelo utilizado pela maioria das empresas aéreas, como Panair, Real, Cruzeiro, Varig, Vasp, Sadia (depois TransBrasil), entre outras, a partir de 1943. O DC-3 só deixou de voar em rotas comerciais no Brasil em 1985, sob as cores da Votec.

No total, 27 companhias brasileiras operaram 255 Douglas DC-3, muitos modificados para o padrão civil após a Segunda Guerra Mundial. A FAB operou 82 Douglas C-47 entre 1944 e 1983.


A história do "Rose"

A aeronave foi construída em 1943 pela Douglas Aircraft Co., em Santa Monica, EUA. Durante a II Guerra Mundial, transportou pára-quedistas à França na invasão do Dia D, em junho de 1944, e ainda preserva algumas marcas dessa batalha em sua fuselagem.

Após a II Guerra Mundial, o avião retornou aos Estados Unidos, onde voou com as cores da Pan American Airways, além de ser operado no Brasil por sua subsidiária Panagra (Pan American Grace Airways). Em seguida, o "Rose" fez parte da frota de diversas outras companhias aéreas, até ser usado para lançamento de pára-quedistas, antes que o casal John e Betty Pappas o comprasse e o utilizasse para realizar vôos panorâmicos, com quem o "Rose" viajou por quase todas as cidades dos Estados Unidos, além de ter sido usado pela TCM (Turner Classic Movies) em diversas filmagens de clássicos do cinema americano. Depois, a Boeing o comprou e o doou ao Museu Asas de um Sonho em plenas condições de vôo.



Voando no "Rose"

No dia 24 de agosto de 2007, fui informado pelo Comandante Rogerio Castellao de que ele iria até Tabatinga, no Amazonas, para auxiliar a tripulação norte-americana que estava trazendo o DC-3 "Rose", prefixo N101KC, na jornada até o aeroporto de Cumbica, em Guarulhos.

Castellao viajou para a Amazônia no domingo, dia 26 de agosto. Estava planejado pousar no aeroporto de Cumbica na quarta-feira, dia 29 de agosto, para liberar o "Rose" na alfândega e pousar em São Carlos no dia seguinte, quando eu faria as fotos da chegada da aeronave.

Para minha sorte, na quarta-feira, dia 29 de agosto, o "Rose" teve uma pane nos magnetos quando sobrevoava a região de São Carlos e a tripulação foi obrigada a pousar no aeroporto da cidade para resolver o problema.

Logo após o desembarque, o Comandante Castellao me ligou para informar que estava no aeroporto de São Carlos e, algumas horas depois, corri para ver pela primeira vez o Douglas DC-3 do museu da TAM.

Quando fazia algumas fotos do interior da aeronave, o Comandante Castellao me convidou para voar no dia seguinte até Guarulhos, realizando uma escala técnica no aeroporto Campo dos Amarais, em Campinas. Detalhe: Não existe gasolina de aviação no aeroporto de São Carlos, somente querosene de aviação, que é o combustível usado por aeronaves a turbina, como os jatos da TAM.

Voltei para casa achando que estava sonhando e logo tratei de me livrar dos compromissos da quinta-feira, dia 30 de agosto. Se tratava de uma oportunidade única, já que eu nunca havia feito um vôo sequer a bordo de um DC-3.


O vôo

No dia seguinte, dia 30 de agosto, cheguei às 9 horas ao aeroporto de São Carlos. Antes de seguirmos para Guarulhos, o Comandante João Amaro recebeu a tripulação do "Rose" no museu Asas de Um Sonho para mostrar com muito orgulho o acervo de aeronaves raras e muito bem cuidadas.

O "Rose" decolou de Corona, CA, no dia 1º de agosto, com destino ao aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, com o comandante John Pappas, ex-proprietário do "Rose", sua esposa, Betty, e
o co-piloto, Doug. Logo após a entrada no Brasil, a tripulação aproveitou para passar uns dias na Amazônia, até que em 27 de agosto iniciaram a viagem até São Paulo.

Após a escala em Cuiabá, no Mato Grosso, a tripulação aumentou com a entrada do mecânico Rogério Monteiro, que trabalha para a TAM no aeroporto da capital mato-grossense. Rogério acompanhou o "Rose" até São Paulo, quando embarcou em um avião Airbus 320, da TAM, de volta para Cuiabá. "Quando me convidaram para ir de DC-3 de Cuiabá até Cumbica, não pensei duas vezes, mas alguns amigos mecânicos acharam que eu estava louco de voar nesse avião", disse Rogério. Isso mostra que no Brasil pouca gente conhece a história da aviação, e revela o quanto é importante o trabalho do museu Asas de Um Sonho, já que o Dc-3 é um dos aviões mais seguros do mundo.

A partir de São Carlos, embarcaram Jorge Luiz Stocco, gerente de restauração do museu da TAM, Daniel Gonçalves, gerente de manutenção da TAM Linhas Aéreas, em São Carlos, e eu.

No vôo até o aeroporto Campo dos Amarais, em Campinas, foi possível
sentir um pouco de turbulência durante todo o tempo, principalmente na região de Rio Claro, devido ao terreno que é muito acidentado e conta com a serra no município vizinho de Corumbataí, mas nada que não nos desse uma visão maravilhosa da região, que estava ensolarada. Em seguida, sobrevoamos a represa de Americana até chegarmos ao aeroporto de Campinas, tudo proporcionado pelo DC-3, que voa abaixo da altura dos aviões de linha aérea regular por não ser pressurizado. Um excelente vôo panorâmico. Vinte e oito minutos depois da decolagem, estávamos em Campinas.

Inicialmente, estava planejado pousar no Campo dos Amarais e seguir para o Hangar José Ângelo Simioni, de propriedade do Comandante Carlos Edo, líder do Circo Aéreo, conhecido popularmente como Esquadrilha Oi, devido ao patrocínio da companhia telefônica. Mas quando nos aproximamos do aeroporto, o Comandante John Pappas iniciou uma passagem rasante sobre a pista, a partir da cabeceira do Aeroclube de Campinas até o hangar de manutenção da Trip Linhas Aéreas. Foi uma passagem magnífica. Ao mesmo tempo em que achava que estava sonhando, pensei em quem teve a sorte de ver o "Rose" realizando aquela passagem rasante a poucos metros do solo. E eu estava dentro do avião. Que sorte a minha!

Depois do "rasante", o aeroporto praticamente parou até que nós pousássemos poucos minutos depois. Todo o pessoal estava em volta da pista observando o DC-3 "Rose". Taxiamos em direção ao hangar do Comandante Carlos Edo e logo descemos do avião. Em seguida, os funcionários da Trip e algumas pessoas que estavam próximas ao avião, se aproximaram e conheceram o "Rose" por dentro e por fora. Após a visita dos curiosos, já que não é todo dia que temos uma oportunidade dessas, o DC-3 foi abastecido com 1.400 litros de AvGas (gasolina de aviação). Durante o abastecimento, o Comandante Adilson Kindlemann decolou com o SU-31, PT-ZSV, e fez algumas acrobacias. Ele nem sabia que o "Rose" estava no Campo dos Amarais, tanto que voou sem fumaça. Pura sorte nossa em ver as manobras do "Kindão", um dos mais brilhantes do Brasil. Logo depois, o Comandante Carlos Edo embarcou conosco para voarmos até Cumbica, onde ele embarcaria em um vôo comercial para o Rio de Janeiro.

A segunda perna do vôo foi interessante. O tempo estava fechado entre Jundiaí e Guarulhos, mas quase não sentimos os efeitos de turbulência, apesar de estarmos "encaixotados", pois havia nuvens por todos os lados do "Rose". Só víamos o solo em algumas situações e, depois, na aproximação final, poucos metros antes de pousarmos em Cumbica.

Durante o pouso, havia um Airbus A-320, da TAM, esperando para ingressar na pista para onde nós fazíamos a aproximação. Quando passamos em frente ao A-320, o comandante da TAM disse: "Belíssima aeronave". Fiquei imaginando o que pudesse estar passando na cabeça dele, já que, sem mais nem menos, pousava o DC-3 do museu da TAM em pleno aeroporto de Cumbica, o mais importante da América Latina.

Em seguida, taxiamos em direção a BASP (Base Aérea de São Paulo), que situa-se no lado oposto aos dois terminais de passageiros do Aeroporto de Cumbica. Lá havia muita gente esperando para ter contato com o "Rose", entre militares e fotógrafos, como Ricardo Beccari, um dos mais importantes do Brasil, especializado em aviação, exclusivo da revista Aeromagazine.

Mesma cena vista meia-hora antes em Campinas: Todos queriam conhecer o interior do DC-3, e enquanto isso, notei que um
McDonnell Douglas C-17A Globemaster III, prefixo 60-0002, da US Air Force, taxiava para decolar. Corri para fazer umas fotos. Nunca tinha visto essa aeronave em São Paulo. Foi mais uma coincidência para eu não esquecer esse dia. Em seguida, voltamos para o DC-3 e taxiamos em direção ao pátio em frente aos terminais de passageiros para liberar o "Rose" na alfândega. Os fiscais da Receita Federal, assim como a maioria das pessoas, ficaram observando o DC-3, já que não é todo dia que se tem contato com uma lenda viva dessas. Enquanto o avião era vistoriado, conheci o Senhor Ian Comber, um dos diretores do museu da TAM, que estava em São Paulo aguardando a nossa chegada. Avião liberado, retornamos a bordo do "Rose" para o pátio da BASP. O DC-3 ficou lá até o dia seguinte, mas o Daniel e eu retornamos para São Carlos, onde eu faria fotos do avião em vôo. Para nossa sorte, havia uma van da BASP que iria levar algumas peças para o PAMA (Parque de Material Aeronáutico) da FAB (Força Aérea Brasileira), no Campo de Marte, e nós aproveitamos para pegar uma carona com dois militares, que nos deixaram no Terminal Rodoviário do Tietê, a poucos metros do aeroporto da zona norte. Que sorte a nossa! Fiz a seguinte pergunta: Será que esse dia vai se repetir? Acho que nunca mais isso vai acontecer. Deu tudo certo e embarcamos em seguida em um ônibus da Cometa para São Carlos.

No dia seguinte, 31 de agosto, cheguei ao aeroporto de São Carlos às 9 horas, mas o "Rose" só pousou às 16h35! Valeu a pena esperar. Meu irmão, Rodrigo Zanette, chegou de São Paulo e foi logo se aprontando para fotografar o "Rose", que ele não conhecia pessoalmente. Para mim coube filmar a chegada do DC-3. Avião sobrevoando o aeroporto, nós dois em cima da torre de controle, o "Rose" vai pousar e nós vamos fazer as imagens. Para nossa surpresa, o Comandante John Pappas resolveu fazer uma passagem rasante em frente às oficinas do CT da TAM e do prédio do museu. Linda passagem! Logo depois, um pouso perfeito pela pista 2 e o corte dos motores.

Foram
10 mil quilômetros voados desde Corona, nos Estados Unidos, onde o avião decolou no dia dia 4 de Agosto, até a chegada ao Brasil 27 dias depois, na sua nova casa, em São Carlos.

O DC-3 "Rose" está estacionado desde o dia 1° de setembro em um dos hangares da TAM, ao lado da torre de controle do aeroporto de São Carlos. Em breve será feito um trabalho de restauração e o avião deve continuar voando, desta vez com as cores da Panagra, mantendo o nome "Rose" no nariz.

Um mês depois, Castellao me informou de que o Comandante John Pappas não conseguiu ficar sem um DC-3 e já comprou um outro Douglas para continuar a operar os "Dream Flights" em Corona.

 

 

  
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